PROF. MANUEL MÁXIMO PRATES
J. FRAGA DE AZEVEDO
Nunca pude esquecer as condições em que conheci o Prof. Máximo Prates. Estávamos no ano de 1931. Subia eu, envergando a minha farda de 2º tenente médico, a encosta que de Santa Apolónia conduz ao Hospital da Marinha, quando um cavalheiro, irradiano a maior simpatia e que seguia o mesmo caminho, se dirige a mim num ar do maior à-vontade, indagando qualquer esclarecimento sobre o Hospital. Este acto, averiguei-o logo a seguir, não foi mais que um pretexto para entabularmos daí em diante conversa sobre assuntos da Armada e particularmente sobre a vida médica naval.
Com grande surpresa minha entra também no Hospital e dirige-se ao gabinete do médico de serviço a quem se apresenta: Cap.-tenente médico Manuel Máximo Prates. Fiquei confundido. Já conhecia por tradição o dr. Máximo Prates. Na marinha, onde eu servia desde 1930, o seu nome era com frequência invocado sempre com o maior respeito e admiração e assim habituara-me a ver no Dr. Prates uma figura do maior prestígio e do maior valor para a corporação tão nobre e tão rica de tradições a que eu tinha a honra de pertencer.
A circunstância em que travamos relações, definiu só por si o espírito franco, atraente, e livre de preconceitos que caracterizava o Prof. Prates.Por esse tempo também já eu acompanhava com o maior interesse as actividades da Escola de Medicina Tropical e aí, devido às relações amigas que me proporcionara o Prof. Marques Perdigão, habituara-me igualmente a admirar o Dr. Prates, mercê da superior reputação que o contacto que anteriormente tivera com a Escola lhe havia criado.O convívio que seguidamente se estabeleceu entre nós, tanto no Hospital da Marinha, onde passamos a servir juntos, como na Escola de Medicina Tropical, para onde nos dirigimos diariamente após os trabalhos do Hospital, fortalecera a simpatia que o primeiro encontro havia criado e cimentara uma amizade que se revelara sólida para o futuro.Se, com o Prof. Marques Perdigão, havia encontrado na Escola de Medicina tropical o ambiente amigo e propício para que os meus primeiros passos ali fossem dados com todo o interesse e proveito, vim depois a encontrar no Prof. Máximo Prates o estímulo, o apoio e a orientação de que carecia para enfrentar as dificuldades que havia a vencer na carreira que desejava abraçar.
Desde o primeiro encontro que tive com o Prof. Prates, jamais deixei de merecer o prazer e a honra da sua boa amizade e de apreciar a irradiação do seu espírito fulgurante.Na verdade, quem tinha ensejo de entrar na sua convivência, ficava desde logo cativado pela sua simpatia comunicativa, pelo sabor da sua atraente conversa e da sua vasta cultura e pelo fulgor da sua inteligência. Quem depois tivesse a honra de merecer a sua simpatia e a sua amizade, passaria a admirar um carácter íntegro e recto, dos que são definidos pela expressiva frase de «antes quebrar que torcer», uma dignidade do mais fino quilate, um aprumo moral impecável, a par duma modéstia natural e uma tolerância e generosidade próprias de quem é verdadeiramente bom.Recordemos alguns passos da carreira que seguiu para melhor ajuizarmos das razões em que se fundamentava a superior reputação que aureolava o seu nome.
O Prof. Manuel Máximo Prates, nasceu em 21 de Dezembro de 1886 numa típica localidade alentejana, a Aldeia Velha de Santa Margarida, do Concelho de Aviz, de onde transitou mais tarde para Montargil, de Ponte de Sor. Ao contacto com a natureza da tão típica e tradicional província que o viu nascer se formou e fortaleceu o seu carácter que com tanta firmeza se devia evidenciar pela vida adiante.Na verdade, ali viveu na infância e em parte da sua juventude, podendo mesmo dizer-se que nunca perdeu o contaco com a terra natal cujas tradições não podiam deixar de ter exercido influência na sua maneira de ser.
Depois de ter obtido o curso do liceu em Coimbra, veio frequentar em Lisboa a Escola Médica, que concluiu em 1913, e onde exerceu funções de assistente.Terminado o curso de medicina concorreu a médico da Armada e aqui iniciou a sua carreira como 2º tenente, em 17 de Janeiro de 1914. Na nobre Corporação, que muito se honrava de servir e que muito prezava, veio a alcançar em 20 de Março de 1942 o posto máximo da sua vida, o de capitão de Mar e Guerra Médico.Nos 28 anos de vida activa na Armada, o Prof. Prates desempenhou cargos diversos e participou em numerosas comissões, sempre com o maior êxito e maior elevação, como é atestado pela sua brilhante folha de serviço militar prestado a bordo de diversos navios de guerra «Bengo», «Beira», «Vasco da Gama», «S. Gabriel», em Cabo Verde, Angola, S. Tomé e Príncipe e Guiné, e em vários serviços em Terra.Durante a primeira Grande Guerra Mundial, o Prof. Prates, como médico do cruzador auxiliar «Pedro Nunes», que actuou durante mais de 2 anos em zonas de minas e bloqueadas por submarinos, em constantes viagens para França, Inglaterra e outros pontos, prestou serviços importantes que o levaram justamente a ser incluído no louvor que por esse facto foi concedido à guarnição do mesmo navio. Também «pelos relevantes serviços da sua especialidade prestados à tripulação do contra-torpedeiro «Piauhy» e às forças em operações em cabo Verde durante a epidemia da gripe pneumónica, foi concdecorado em 1919 com o grau de Oficial da Ordem da Torre e Espada.À parte a sua participação na Guerra, ao Prof. Prates foram cometidos cargos da maior importância, como os de Presidente da Junta de Saúde Naval, Subdirector do Hospital da Marinha, Inspector de saúde Naval, Presidente da Comissão Técnica de Saúde Naval, Membro dos Conselhos de Promoção de Oficiais da Armada, Membro da Junta para avaliar da aptidão dos inválidos de guerra, etc.
Compreende-se, em face do que vem de ser referido, quão justificáveis foram os diversoso louvores que constam da sua folha de serviço e bem assim as condecorações que lhe foram atribuídas, como as da Comenda da Ordem Militar de Aviz, as Medalhas da Vitóri, a Comemorativa das campanhas do Exército Português, a Militar da Comportamento Exemplar e a Oficial da Ordem Militar de S. Tiago de espada, do Mérito Literário, Científico e Artístico.
Na sua carreira naval não pode esquecer-se a acção que desempenhou no Hospital da Marinha como médico oftalmologista em 1920 e 1921, especialmente que lhe veio da sua frequência no Instituto gama Pinto, onde em 1912 fez exame do curso ali ministrado e realizara a sua tese sobre «catarata diabética».
Mais tarde, de 1931 a 1935, exerce no mesmo Hospital as funções de adjunto e a seguir, desde 1935 a 1937, as de Director do Laboratório, tendo aí deixado o seu nome ligado às novas instalações laboratoriais, executadas em grande parte segundo as suas directrizes.
Não deve esquecer-se também, que foi certamente o contacto com os problemas apaixonantes do Ultramar Português, devido à sua carreira naval, que lhe despertaram o interesse e o entusiasmo pela Medicina Tropical. Desta forma continuou o Prof. Prates a assegurar as honrosas tradições que os médicos da Armada de Portugal e de outros países com interesses nas regiões quentes tão brilhantemente haviam criado naquela ciência do mais prometedor futuro.
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In: Separata dos ANAIS DO INSTITUTO DE MEDICINA TROPICAL, Volume XI, Nºs 3-4, Setembro-Dezembro de 1954 – Cota: HG 19205, da Biblioteca Nacional de Lisboa
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